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quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Um velho

Meus amigos como vão!
Desta vez foi quase...
Isso mesmo!
Quase que vocês ficam sem essa minha redação de 2016!
Todos os anos participo da Olimpíada de Redação de Jundiaí, esse ano na sua 12ª Edição.
Meu ritual é simples: como o texto tem de ser inédito, vejo o tema, faço a composição e as correções (sempre acabo deixando algum erro passar, isso é de praxe), depois de enviar para o concurso, copio o original para meu pendrive e aguardo o resultado.

Sendo premiado ou não (ainda não tive esse prazer), acabou fazendo a divulgação da redação, só que neste ano, para meu azar, meu pendrive "deu pau" e perdi o arquivo original.
Tentei de todas as formas através do programa Recuva, que já me salvou noutras vezes com um milhão de fotos perdidas, recuperar este documento apagado do meu micro, mas não teve jeito! 
Cheguei a conclusão que havia perdido o texto e mesmo que eu eu quisesse compor outro parecido, os amigos que escrevem sabem, jamais ficaria da mesma forma.
Minha última alternativa foi pedir a gentileza da direção da Olimpíada, que fica a cargo da Biblioteca Municipal de Jundiaí, onde uma funcionária esplêndida conseguiu autorização da direção e me enviou agora a pouco uma cópia do meu arquivo original, imaginem a minha cara de felicidade e a gratidão que eu senti...
Por sorte, hoje mesmo tenho que ir dar um passei na Biblioteca citada, pois eu não ganhei, além da grata satisfação de participar, mas minha filhota Nicole ficou em 11º lugar em sua categoria, recebendo um dinheiro para poder comprar seus presentes no Dia da Crianças e ainda vai sobrar para um par de coxas de Peru para o Natal! :)
Vou aproveitar este meu passeio por lá para tentar conseguir encontrar a alma caridosa que me auxiliou e lhe dar um merecido abraço. Graças a elas, eis a minha participação deste ano, onde discorri sobre pessoas que têm mais idade, mas que ainda têm muito de bom para contribuir com o nosso mundo!
Abraços renovados para todos!

Robert de Niro no filme Um Senhor Estagiário

Um velho

Quando olho no espelho, nesse dia tão especial, vejo um velho que já foi jovem faz muito tempo, memórias demais para recordar.
Não sou pobre, talvez esteja rico, não foi fruto da sorte, mas do trabalho, algo que começou num sonho e ainda não terminou, ainda não, possuo estórias inéditas para escrever nesse longo livro da vida enquanto estiver aqui entre os meus.
“Os meus!”
Se foram meus, esses seres que em alguns momentos me cercam, hoje já não mais o são, pois na maior parte do tempo é na solidão que passo meus dias, por mais atividades que ainda consiga desenvolver.
Levanto cedo e ao contrário de outros senhores que vão passear no parque ou fazer caminhada, minha jornada me leva direto para minha empresa, que tem o nome da minha finada e amada esposa. Gerencio com maestria todas as problemáticas que surgem, desde a produção dos alimentos que fazemos até o simples lidar com contratação e demissão de funcionários.
É claro que não faço tudo isso sozinho, tenho uma grande equipe de funcionários e colaboradores, entre eles muitos familiares que criticam constantemente meus atos e por vezes cochicham pelos cantos, num tom inapropriado, já que se esquecem de que a velhice não me tirou a audição, que eu deveria curtir a minha aposentadoria passeando nos parques, fazendo caminhadas, essas coisas que os velhos fazem muito bem…
Eu imagino o que se passa pela cabeça dos meus familiares: minhas ideias são antiquadas, a minha maneira de lidar com funcionários nos dias atuais não é mais aceita pela maioria das indústrias e principalmente, a minha opinião forte e decidida os impede de transformar essa empresa, que foi gerada através do amor, numa outra qualquer que potencialize os lucros e nada mais.
Muitas vezes sinceramente eu me pergunto se eles ainda sabem do que se trata o amor, de como é se utilizar desta ferramenta mágica e infinita para tomar as decisões, da alegria estonteante que se sente ao fazer a escolha correta. Se a bondade saiu mesmo fora de moda, então sim, estou velho demais para esse mundo e seus novos conceitos, mas como não aprendi em nenhum momento da vida a desistir, vão ter que me aturar enquanto eu for capaz de continuar tentando lhes ensinar que a melhor maneira de conduzir um negócio não é através da frieza de um sopro de outono, mas ainda da leve brisa primaveril que aquece os corações. Se eles vão aprender ou não, essa já é outra história, a minha parte eu tenho o dever de fazer bem feito, de continuar com a minha atitude exemplar.
Eu tentei deixar que eles conduzissem a empresa do seu modo, ficando somente como um conselheiro administrativo, mas quando percebi que queriam me transformar em somente um símbolo que não tinha poder nenhum de decisão, mais parecendo um mero enfeite na parede do escritório, fiz novamente valer a minha vontade de maior acionista e retomei o comando antes que a empresa perdesse a sua verdadeira marca, tão difícil de moldar através dos anos.
Percebi que só queriam me usar, tal um fantoche, numa decisão simples de demissão de um velho funcionário da empresa, que por se ausentar durante alguns dias para ir enterrar um dos seus filhos que morreu em outro estado, recebeu no seu regresso um aviso prévio de trinta dias. Como não fui consultado, interferi diretamente no departamento de pessoal e converti o ato de demissão numa advertência de que no futuro esse senhor informasse a empresa de fatos que o levassem a cometer faltas no trabalho que fossem entendidas como injustificadas.
É lógico que este funcionário foi movido pela dor de perder um ente querido da sua família, um “dos seus”, é totalmente compreensível, mas alguém de coração mais duro do que o meu entendeu que não, concluindo que o castigo pela insensibilidade de não informar ao seu empregador que uma morte o deixaria longe por alguns dias, fosse a perda do seu emprego.
Será que fui errado em intervir? Será que foi incorreto da minha parte retomar meu lugar na direção da empresa?
Tenho certeza que não, eles têm muito ainda para aprender com esse velho…
E hoje enquanto olho neste espelho, neste dia tão especial, onde a minha casa geralmente tão silenciosa se encherá da alegria dos meus netos e bisnetos, onde “os meus” virão em peso para comemorar meu septuagésimo quinto aniversário, eu deveria ver um reflexo mais feliz no espelho, mas ao contrário disso vejo um rosto cansado, marcado, sofrido, o rosto de um velho solitário.
Já me convidaram para morar com eles em outros lugares, outras cidades, outros países, mas é aqui que chamo de lar, nessa pequena cidade que me escolheu adotar onde sou feliz tal um filho da terra. É nessa cidade que trago na memória todos os sorrisos que dei, todos os desafios que enfrentei, todas as pessoas que amei, tudo aquilo que infelizmente já se tornou passado.
Sair daqui significa abrir mão disso tudo que é o combustível que me mantém vivo.
Seria maldade minha pensar que “os meus” conhecem esse meu segredo?
É claro que estou equivocado, eles me amam, vejam vocês, lá estão eles chegando, entre risadas e cheio de pacotes coloridos embrulhados. Tenho certeza que para eles eu não sou um fardo, sou algumas vezes um pouco chato e turrão e talvez independente demais para a minha idade, assim eles pensam.
Na verdade sei também que valorizarão mais meus exemplos de conduta quando eu não mais estiver entre eles, quando eu estiver num outro plano, mas esta não é uma decisão que cabe a mim e enquanto me couber continuar escrevendo minha longa estória, dia após dia, tolos serão eles se não a lerem atentamente e de lá não retirarem importantes lições pautadas na sabedoria de um velho.